terça-feira, 31 de outubro de 2017

Diversidade - Eleições - Voto evangélico? Não é bem assim



Voto evangélico? Não é bem assim
A relação entre fé e política é mais tênue - Foto: Agência Brasil
A última pesquisa Datafolha sobre a influência de líderes religiosos na política revela: os fiéis não devem ser tratados como um grupo monolítico.
A última pesquisa do Instituto Datafolha, destacada na primeira página da Folha de S. Paulo em 23 de outubro, revela aspectos interessantes para se discutir a relação entre religião e política no Brasil.
O primeiro mostra que somente uma pequena parcela dos brasileiros, 19%, leva em conta a opinião de seus líderes religiosos quando estes fazem campanha por algum candidato. Entre os evangélicos, 26% dizem considerar esta orientação. O índice sobe para 31% entre fiéis neopentecostais. Entre os católicos, a taxa é de 17%, um pouco abaixo da média. Apenas 9% dos entrevistados disseram já ter votado em alguém indicado por líderes da igreja.
O segundo aspecto da pesquisa foi o levantamento de votos para presidente da República em 2018. Foram apresentados alguns cenários com nomes que frequentam o noticiário político, como o ex-presidente Lula, o prefeito de São Paulo João Doria e o deputado federal Jair Bolsonaro.
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Não vamos discutir aqui o teor do texto da Folha que trata destes números, pois, a meu ver, é espúrio do ponto de vista da ética jornalística. Ele traz uma manchete (“Evangélicos derrubam Lula”) que não corresponde àquilo que os números da própria pesquisa mostram (o ex-presidente lidera em todos os cenários nos quais é incluído).
O que nos interessa é que o ex-presidente Lula, do PT, lidera o principal cenário entre os eleitores evangélicos, com 32% de preferência. Marina Silva, da Rede, evangélica, ficaria em terceiro com 17%, atrás do deputado Jair Bolsonaro, do PSC, que levaria 21% dos votos.
A pesquisa ainda mostra que 66% dos evangélicos não têm preferência partidária (número maior do que a média nacional, de 59%). Entre aqueles que têm, o PT é o partido preferido, com 18%. Com números bem menores aparecem os outros dois favoritos, o PSDB com 4% e o PMDB com 3%.  Estes índices correspondem à última pesquisa geral com eleitores do Datafolha.
A pesquisa reafirma algo em que insisto aqui nos textos desta coluna: que ao nos referirmos a "evangélicos" não tratamos de um grupo monolítico, único, coeso. É uma teia formada pelos mais variados fios, que representam teologias, práticas, costumes, visões de mundo, estruturas organizacionais as mais diversas.
Portanto, é um grande equívoco (quando não má-fé para conduzir campanhas oportunistas) falar de "voto evangélico" em geral ou de um apoio político único dos evangélicos. Isso não existe. São cidadãos autônomos que decidem pelo voto, fundamentalmente, de acordo com suas preferências. As duas eleições que alçaram Dilma Rousseff à Presidência da República são fortes exemplos. Se correspondessem àquilo que bradavam líderes em evidência no cenário religioso, Dilma não teria recebido tantos votos de evangélicos.
Aprender a ver os evangélicos com um grupo fragmentado e diverso é uma primeira lição a ser tomada, que ajuda a superar ações de má-fé política.
No mesmo sentido, não é possível identificar um representante dos evangélicos. Ou seja, alguém que possa falar pelo segmento ou ser apontado como "formador de opinião dos evangélicos". 
Esta foi uma armadilha que "engoliu" as grandes mídias noticiosas. Tendo na imaginação a estrutura hierárquica do Catolicismo Romano, que começa no Papa e passa por cardeais, arcebispos, bispos e organizações como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que falam pelo segmento católico, jornalistas, em geral, desconhecedores do mundo evangélico, buscaram a fala de um representante. E deram voz apenas a quem pautou as mídias com declarações conservadoras em torno de temas da moralidade sexual.
São muitas as reportagens e entrevistas com pastores e políticos do universo pentecostal credenciando-os como porta-vozes dos evangélicos. Mas esses líderes não só não representam o segmento, como geram controvérsias dentro e em torno desse grupo religioso. São comuns posturas desrespeitosas e bélicas em relação a quem pensa e age diferente do que eles pregam ser a religião verdadeira. Com isso, as teologias, práticas e visões do mundo que estão entre os evangélicos em direção oposta, com solidariedade, humildade, misericórdia, busca da justiça, têm ficado invisíveis.
Aprender que as muitas vozes devem ser ouvidas com o mesmo grau de destaque é outra lição no que diz respeito aos evangélicos, o que vale também para outros segmentos sociais também invisibilizados. 
Por hora, em se tratando de política, vale a inspiração da referência maior dos cristãos, Jesus de Nazaré: "sede, portanto, prudentes como as serpentes e símplices como as pombas" (Mateus 10.16).
Em tempo: na terça-feira 31 serão celebrados no mundo inteiro os 500 anos da Reforma Protestante.
Fonte: CARTA CAPITAL

Diversidade - Memória - A reforma protestante, 500 anos depois



A reforma protestante, 500 anos depois
Estátua de Martinho Lutero em Dresden, na Alemanha
Cinco séculos atrás, Martinho Lutero pregava suas 95 teses na porta da igreja do castelo de Wittenberg. O que mudou desde então?
Nesta terça-feira, 31 de outubro, igrejas protestantes em todo o mundo celebram os 500 anos da Reforma Protestante. Esse dia ficou conhecido como aquele em que o monge alemão Martin Luther teria pregado suas 95 teses na porta da igreja do castelo da cidade alemã de Wittenberg. Elas representavam uma tomada de posição contra o que Lutero considerava práticas abusivas do clero católico romano, como a venda de indulgências (uma forma de perdão dos pecados), e posições doutrinárias que desviavam dos valores primeiros da fé cristã.
Martinho Lutero não foi o único. Houve muitos outros europeus, homens e mulheres, que se notabilizaram como “protestantes”, aqueles que traziam a dimensão contestatória à fé cristã, própria do cristianismo, num chamado ao retorno às origens (perdidas) do ser cristão.
Do século XVI para cá, a reforma marcou a história, tanto da Europa quanto dos demais continentes, por meio da atuação de missionários luteranos, reformados (congregacionais, presbiterianos), batistas, metodistas, anglicanos/episcopais. No século XX surgiram os pentecostais, expressão de um movimento de protesto e afirmação da população negra, migrante, feminina e pobre nos Estados Unidos.
Aspectos críticos desta memória como a cumplicidade do protestantismo com o capitalismo e também com o imperialismo (das ocupações coloniais da África, da Ásia e da Oceania) são abordados por vários estudiosos.
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Por outro lado, a história destaca a contribuição de protestantes em ações pela justiça social e os direitos humanos como os movimentos de promoção da paz durante guerras. Também contra o racismo, como as lutas pelos direitos civis, com o pastor batista Martin Luther King, e contra o apartheid na África do Sul, lideradas pelo metodista Nelson Mandelae pelo bispo anglicano Desmond Tutu, entre outras causas. E ainda nas frentes por democracia e em oposição a regimes de exceção, como os protestantes no Brasil, Chile, Uruguai e Argentina.
No Brasil, a diversidade é enorme, são muitos os grupos confessionais, desde os mais vinculados às raízes da reforma, aos que advêm do pentecostalismo do século XX até aos que emergem dos novos movimentos evangélicos das últimas décadas, denominados neopentecostais.
Desde os anos 2000, os protestantes (historicamente identificados como “evangélicos”) têm adquirido mais visibilidade no espaço público brasileiro. O crescimento numérico e geográfico, principalmente dos pentecostais é responsável por isto, juntamente com a ampliação de presença nas mídias e na política partidária.
Esta visibilidade intensa é fonte de afirmação social dos evangélicos que há poucas décadas eram uma minoria religiosa silenciada. Ao mesmo tempo, é motivo de apreensão e suspeita de quem vê este segmento religioso como uma ameaça por conta do que é veiculado nas mídias e nas propostas políticas: espiritualização de males sociais, submissão da mulher, controle do corpo e da sexualidade, defesa de vingança contra praticantes de crimes, do uso de armas mortíferas para a defesa da população, entre outros.
Soma-se a esta imagem negativa, o destaque dado por algumas igrejas à questão financeira, à busca de benefícios materiais pelos fiéis somada à retribuição na forma de ofertas em dinheiro. Também, algumas ações missionárias com indígenas que negam as suas culturas e lutas por direitos. Ainda, a demonização de outros grupos religiosos promovida por certas lideranças, especialmente contra as religiões de matriz africana e também contra católicos e islâmicos.
Se formos rigorosos numa avaliação ética e teológica, podemos dizer que estas práticas, que acabam se tornando “sinônimos” de evangélicos, vão todas na contramão, não só dos princípios da reforma, mas dos princípios cristãos de justiça, misericórdia e liberdade.
É preciso, no entanto, reconhecer que esta imagem negativa acaba apagando outras muito positivas e bonitas da presença dos evangélicos no mundo e no Brasil: desde projetos de promoção humana e valorização da vida (superação da pobreza, recuperação de indivíduos com dependência química, inclusão para crianças, adolescentes e jovens das periferias das cidades e do País), movimentos pelo Estado de Direito, pela Justiça de gênero.
Entre estas ações também podemos citar a valorização de quem é invisível socialmente. Como o cidadão que durante a semana é auxiliar de serviços gerais ou da construção civil e no momento de estar numa igreja se empodera, veste um terno ou um vestido elegante e se torna pregadora do Evangelho, líder de oração ou cuida da educação religiosa de crianças. Quem não conhece estas experiências não tem medida do que isto significa para a autoestima e a dignidade humana. E é uma das mais ricas heranças da Reforma Protestante: o sacerdócio de todos os crentes. Todos têm um lugar no serviço relacionado à fé.
E aqui chegamos a um ponto crucial desta memória: lembrar os 500 anos da Reforma Protestante deve ser oportunidade para a busca de novas reformas. Um dos lemas dos reformadores do século XVI era “Igreja reformada sempre se reformando”. Eis aí um chamado à vocação de protestar, contestar o que vai contra os princípios de fé e os valores coerentes com o Evangelho de Jesus de Nazaré.
Fonte: CARTA CAPITAL

domingo, 29 de outubro de 2017

Política - João Doria: solução ou dor de cabeça?



João Doria: solução ou dor de cabeça?
Doria, ao lado de Jaime Lerner - Rovena Rosa/Agência Brasil
por Adalton Franca de Oliveira* 
O Brasil carece de um fato novo, seja ou não o atual prefeito de São Paulo.
João Doria, prefeito de São Paulo, é um dos nomes fortes para as eleições presidenciais, muito embora não seja unanimidade nem no seu próprio partido. Apesar disso, existe uma corrente do eleitorado e de setores empresariais que defendem que ele seja o postulante do PSDB ao Palácio do Planalto em 2018.
Trata-se de um homem com uma vivência em cargos públicos relativamente rasa, mas longe de ser inexperiente. Quem é Doria? Aos 58 anos de idade, João Agripino da Costa Doria Junior foi eleito prefeito da maior cidade da América Latina e uma das mais populosas do planeta, gerindo um orçamento superior ao de muitos países.
O desafio de administrar uma cidade complexa como São Paulo é grandioso e ele ganhou elogios, apoio, foi criticado e contestado. Manteve-se, porém, firme em suas convicções e desviou pouco do planejamento inicial de sua gestão. Centrado, possui um discurso pronto e sempre bem elaborado, com respostas para quase todos os questionamentos, algumas vezes transmitindo uma imagem que beira a arrogância, como nos casos do combate aos pichadores e o da revitalização da região conhecida como Cracolândia, ocasiões em que não deu margem para uma discussão na sociedade.
Foi, entretanto, corajoso, colocou o “dedo na ferida”, fato que seus antecessores nunca o fizeram, preferindo a omissão. Muitos amam o prefeito e outros tantos o odeiam. Dificilmente se verá um meio termo.
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É homem de negócios, bem-sucedido, fundador e proprietário da empresa que leva seu sobrenome, Grupo Doria, empreendimento que atua nos ramos da Comunicação e Marketing, composto por seis organizações: Lide – Grupo de Líderes, Doria Administração de Bens, Doria Internacional, Doria Editora, Doria Eventos e Doria Marketing & Imagem.
Além de empresário, foi diretor de Comunicação da FAAP, importante faculdade paulista, chairman da Casa Cor, colunista e editor de diversas revistas. Nas décadas de 1980 e 90, ocupou cargos de direção em autarquias ligadas ao turismo na gestão do então prefeito paulistano Mario Covas e do presidente José Sarney. Também foi secretário de Turismo em São Paulo, além de  ter apresentado os programas televisivos “Show Business” e “O Aprendiz”. Possui formação em Comunicação e provavelmente daí adquiriu o talento para o marketing pessoal. É muito presente nas redes sociais, seja por vídeos, postagens de textos ou interações com os seguidores. Trata-se de algo comum e que faz parte do cotidiano do prefeito.
A possível candidatura a presidente nunca foi formalmente descartada. Ele deixou claro em algumas oportunidades que não se sentiria confortável em competir internamente no partido com seu padrinho político, o atual governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Não restam dúvidas, porém, de que o prefeito está balançado com a possibilidade de tornar-se presidente do Brasil.
Doria seria um forte concorrente nas regiões Sul e Sudeste, alavancado pelo fato de ser um novo nome, rico, que em tese não necessita de dinheiro da corrupção. Não teria, porém, tanta vantagem nas regiões Norte e Nordeste, devido ao grande desconhecimento por parte dos eleitores. Por isso, necessitaria de um nome respeitado na parte de cima do mapa como seu vice.
No Centro-Oeste, há margens para o crescimento e a consolidação. Seu partido, o PSDB, é benquisto pelo eleitorado local. No contexto atual em que fortes correntes são investigadas ou envolvidas em situações espúrias, o prefeito de São Paulo embarcaria com destaque pela corrida presidencial. Seu nome é sempre citado em pesquisas.
O que fica no ar e é difícil de definir é se conseguiria ser tão firme no Palácio do Planalto como é na prefeitura. Vale destacar que as amarrações políticas necessárias para gerir o Brasil são infinitamente superiores àquelas da maior cidade do País. Existem muitos interesses envolvidos e gente a ser agradada.
O “jogo de cintura” não é umas das maiores qualidades de Doria. Recentemente, ele vetou o nome do advogado Eduardo de Castro, do PR, para a Secretaria do Verde, com a justificativa de que o mesmo não possuía qualificação técnica para ocupar a função, o que causou um mal-estar no partido aliado, que retirou de forma provisória seu apoio ao governo municipal.
Certo é: até a definição do PSDB, haverá um grande vaivém político envolvido, e o nome indicado pelo partido terá grandes probabilidades de se tornar o novo presidente do Brasil.
O Brasil carece de um novo fator, um choque de gestão, não necessariamente João Doria. Estamos órfãos de candidatos cuja visão se diferencie da “velha e boa política”, e talvez aí resida o perigo. Temos diversos candidatos e partidos com discursos modernos e disruptivos, porém com atitudes nem um tanto inovadoras.
* “Sócio” desde 2017
Fonte: CARTA CAPITAL

Infraestrutura - Tecnologia - A Marinha mostra o rumo

AlmiranteFerreiraMarques.jpg
Há quem pense que é desnecessário desenvolver tecnologia própria, mas é um erro, sublinha o contra-almirante Ferreira Marques
Em meio a uma crise sem precedentes, política, econômica e social, um programa da Marinha mostra que as melhores soluções são acessíveis em um país como o Brasil. Inspiradas no mais puro nacionalismo, no melhor sentido, enquanto os Poderes da República estão conluiados no projeto de entregar ao capital estrangeiro os bens mais preciosos da nossa terra.

Em uma análise por ora infelizmente acadêmica, a rota a seguir nas circunstâncias é a mesma já percorrida de forma descontínua pela própria nação nos períodos em que ensaiou o desenvolvimento, inspirou esperança ao seu povo e respeito aos estrangeiros.

A história mostra que, para seguir os melhores exemplos da experiência internacional bem-sucedida e dos próprios sucessos do passado, será indispensável:

1. Manter a soberania política e territorial e a incolumidade dos recursos materiais, os descobertos e aqueles por descobrir, em terra, no mar e nas bacias hidrográficas.
2. Investir na pesquisa e no desenvolvimento nacionais.
3. Proteger as conquistas científicas e tecnológicas da concorrência internacional.
4. Estabelecer estratégias inteligentes para a transferência de tecnologia.
5. Fortalecer as empresas nacionais.
6. Manter e aumentar o investimento público, entre outros encaminhamentos. Parte por determinação constitucional, parte por contingências históricas, a Marinha do Brasil concretiza em alto nível essas premissas no seu Programa de Desenvolvimento de Submarinos.
É a conclusão a que se chega ao conhecer o Prosub, uma parceria com a França para a construção, no País, de quatro submarinos convencionais e um com propulsão nuclear.
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Os submarinos interessam aos países por terem poder dissuasório, isto é, desestimulam o inimigo a atacar. Difíceis de detectar quando submersos, aproximam-se despercebidos do alvo e isso os torna especialmente temidos. Além disso, a ação antissubmarino é muito dispendiosa.

A área frontal arredondada (calote de 'vant') de um dos quatro submarinos convencionais em construção, feita com equipamento e mãe de obra nacionais
Só o fato de se ter uma força de submarinos eficiente é um fator poderoso de dissuasão. Duas vezes por dia, no entanto, eles ficam vulneráveis. É quando têm de emergir, ou ao menos estender até a superfície um tubo chamado snorkel para captar oxigênio.
Assim funcionam os equipamentos convencionais, com propulsão por motor elétrico alimentado a óleo diesel. Neles, o oxigênio do ar é indispensável à queima do óleo diesel, na função de comburente. 

No caso dos submarinos com propulsão nuclear, o poder do equipamento aumenta substancialmente. O motor elétrico é acionado por um reator nuclear, dispensa comburente e o submarino pode operar submerso por tempo indeterminado, limitado à resistência da tripulação.

Nos Estados Unidos, definiu-se esse tempo em seis meses. Outra vantagem é a velocidade até seis vezes superior à do convencional. “Por possuírem fonte virtualmente inesgotável de energia e poderem desenvolver altas velocidades por tempo ilimitado, cobrindo rapidamente áreas geográficas consideráveis, os submarinos com propulsão nuclear são fatores de desbalanceamento entre forças navais antagônicas”, analisam os autores do livro Marinha do Brasil – Protegendo nossas riquezas, cuidando da nossa gente.
No complexo naval de Itaguaí, um dos quatro submarinos convencionais construídos em parceria com a estatal francesa DCNS, que inclui um contrato específico para transferência de tecnologia
Contar com esses equipamentos é essencial, portanto, à capacidade de defesa de patrimônios como o pré-sal. Os riscos a que estão expostos esse manancial e outros recursos são analisados pelo almirante de esquadra Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Junior, diretor-geral de desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha, em entrevista nesta edição.  

Além do pré-sal, ao longo dos quase 7,5 mil quilômetros de extensão da costa brasileira há um imenso patrimônio de recursos minerais e de biodiversidade na chamada Amazônia Azul, com 4,5 milhões de quilômetros quadrados no Oceano Atlântico, o equivalente a mais da metade da superfície do País.

Nesses domínios foram identificados mais de 150 minerais com valor econômico, inclusive ouro, diamante e matéria-prima para a fabricação de chips e condutores de telecomunicação. As jazidas de carvão duplicam as reservas nacionais. A produção de 100 plataformas de petróleo corresponde a mais de 90% do total nacional. A descoberta do pré-sal catalisou investimentos também para as primeiras concessões de exploração mineral marinha.
A grande biodiversidade contém potencial econômico voltado para as áreas farmacêutica e cosmética. A Marinha monitora o 1,23 milhão de hectares das unidades de conservação em recifes e manguezais, para proteger os respectivos ecossistemas.
O elevador de navios e submarinos está pronto e deverá começar a funcionar neste ano, assim como alguns berços de atracação dos cais principal e auxiliar
O alto custo e o tempo necessário à construção de uma frota naval condizente com as necessidades de defesa da Amazônia Azul e de proteção da navegação civil só aumentam a importância específica do submarino de propulsão nuclear para o País. Dominar a tecnologia necessária ao projeto de construção desse equipamento é o objetivo do Programa Nuclear da Marinha, iniciado em 1979.
O PNM visa também a “capacitação do país no domínio do ciclo do combustível nuclear e no desenvolvimento de uma planta nuclear de geração de energia elétrica, inclusive a construção de um reator nuclear responsável pela propulsão do futuro submarino nuclear brasileiro”.
Segundo uma comparação feita por vários oficiais, tal operação equivale à situação de uma montadora que, além de fazer o projeto de um veículo, monta a estrutura para a sua produção e assegura o suprimento peças e insumos, e tivesse ainda de cuidar da prospecção, exploração e refino do petróleo para obtenção do combustível.
Entre os objetivos assumidos destaca-se, principalmente nestes tempos de desnacionalização acelerada e fragilização do País, o seguinte: “O Programa Nuclear da Marinha foi concebido e está sendo desenvolvido sob o compromisso de utilizar tecnologia totalmente nacional e independente”.

A construção do submarino com propulsão nuclear condiz com a envergadura e o potencial do País, mostra o comparativo Países Superlativos, publicado nesta reportagem. Só três nações – Brasil, Estados Unidos e Rússia –, além de figurarem entre as dez com as maiores áreas, populações e economias do planeta, possuem urânio e dominam todas as etapas tecnológicas para o uso pacífico da energia nuclear. 

Lula
Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Nicolas Sarkozy assinam em 2009 um acordo para construir o primeiro submarino nuclear brasileiro
O comparativo não considera a perda de posição da economia brasileira desde a recessão de 2016 e 2017, considerada reversível. 

A Marinha tem hoje cinco submarinos convencionais com propulsão diesel-elétrica, o mais antigo deles fabricado na Alemanha e os demais no País. O acordo de transferência de tecnologia entre Brasil e França para a fabricação do submarino nuclear, além de outros quatro convencionais, foi assinado pelos presidentes Lula e Nicolas Sarkozy em 2009, como parte da parceria iniciada no ano anterior, e integra a Estratégia Nacional de Defesa.

A França foi o único país a aceitar a transferência de tecnologia específica que envolve só as partes não nucleares e compreende a construção de um estaleiro e uma base naval em Itaguaí, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro

A parceria Brasil-França inclui um acordo político, técnico e comercial, outro de cooperação e um contrato principal assinado entre a Marinha e o Consórcio Baía de Sepetiba, formado pela Empresa Estatal Francesa de Projeto e Construção Naval (DCNS), construtora Odebrecht e a Itaguaí Construções Navais.A última é uma sociedade de propósito específico, em que o governo federal é representado pela Marinha e possui uma ação simbólica (golden share) com poder de veto sobre eventuais decisões.

Segundo o Ministério da Defesa, o Prosub, além da importância evidente para a segurança nacional, é um dos maiores contratos internacionais já feitos pelo Brasil e o mais amplo programa de capacitação industrial e tecnológica na história da indústria da defesa brasileira.

Prevê, além da transferência de tecnologia francesa ao País, a nacionalização dos produtos e sistemas adquiridos em todas as fases do programa, desde a construção, no início, da fábrica de estruturas metálicas até a manutenção do submarino com propulsão nuclear.

Iniciado em 2011, o Programa de Nacionalização do Prosub tem como foco, no caso dos submarinos convencionais, a independência e autonomia dos processos de fabricação pela indústria brasileira. Engloba 104 subprojetos que constituem sistemas, equipamentos ou itens que integram o pacote de material.

A Marinha priorizou 64 subprojetos, levando em conta os aspectos estratégicos de conteúdo tecnológico a ser transferido à indústria nacional e as barreiras tecnológicas a serem suplantadas, entre outros pontos. Até o mês passado, foram visitadas mais de 200 empresas brasileiras convidadas a participar do programa como fornecedoras.
No complexo naval de Itaguaí, 65% das obras foram concluídas, comemora o capitão de fragata Lessa
No caso do submarino com propulsão nuclear estão previstas a obtenção, pela Marinha, de independência e autonomia para o projeto, construção e manutenção do submarino e a nacionalização de materiais, equipamentos e sistemas, à semelhança do estabelecido para as quatro unidades convencionais.
O processo de transferência de tecnologia “gera expressivo arrasto tecnológico no País”, sublinha a Marinha, que se desdobra na nacionalização de sistemas e equipamentos (no valor de, no mínimo, 100 milhões de euros), na pesquisa e desenvolvimento em parceria com universidades, envolve indústrias de alta tecnologia e o campo da medicina nuclear.
Propicia ainda um incentivo expressivo aos seguintes setores ligados à base industrial de defesa: eletrônica, engenharia naval, computação (softwares), mecânicas de precisão e pesada, optrônica, mecatrônica, eletromecânica, metalúrgica, química e nuclear. Merecem destaque ainda os benefícios indiretos à indústria naval brasileira e ao setor de plataformas de prospecção de petróleo off-shore nacionais. 

Em Itaguaí, o complexo naval inclui uma Unidade de Fabricação de Estruturas Metálicas, estaleiros de construção e manutenção, uma base naval e um centro de instrução e adestramento para as tripulações dos submarinos, além de um complexo radiológico.

A Ufem, o prédio principal do estaleiro de construção, o pátio de manobra de submarinos e alguns berços de atracação dos cais principal e auxiliar estão concluídos. A unidade de fabricação e o estaleiro de construção deverão gerar 13,7 mil empregos diretos e 6,5 mil indiretos com o desenvolvimento do programa.
Um túnel de 703 metros de extensão a 14 de diâmetro liga as áreas norte e sul do estaleiro e base naval de Itaguaí
A edificação dos prédios para ativação de baterias do estaleiro de manutenção e para abrigar os simuladores do centro de instrução avança em ritmo acelerado. Perto de 65% das obras foram concluídas. O elevador começará a operar neste ano.

Na Ufem, o capitão de mar e guerra João Ricardo Lessa, gerente do setor nuclear, aponta para a área frontal arredondada, a calota de vant, de um dos quatro submarinos convencionais em construção: “As primeiras calotas foram feitas na França. Esta foi fabricada no Brasil, com utilização de uma prensa nacional e de mão de obra local”, diz.

O Riachuelo deverá ser lançado ao mar em julho, o Humaitá em setembro de 2020, o Tonelero em dezembro de 2021 e o Angostura, em dezembro de 2022. O lançamento do primeiro submarino nuclear está previsto para 2029. A previsão inicial era 2015 para o Riachuelo e 2021 para a conclusão dos outros três convencionais e do nuclear também. 

“Agora há dinheiro, mas houve um período vegetativo em que ficamos sem recursos, entre 1999 e 2007. Antes disso, entre 1990 e 1992, e nos anos 1980, faltou dinheiro também, mas foram períodos pequenos. Em 2015 e 2016 houve novo corte.Dos 250 milhões de reais previstos, chegaram 100 milhões”, relata o contra-almirante André Luís Ferreira Marques, diretor de Desenvolvimento Nuclear da Marinha, que funciona no campus da USP e no Complexo de Aramar, em Iperó, no interior paulista:

As dúvidas de muitos quanto à capacidade científica, tecnológica e empresarial do País revelam-se sem fundamento diante dos avanços do programa da Marinha, mostram tanto a transferência de tecnologia exemplificada por Lessa quanto este relato de Ferreira Marques:

“Quando estiveram aqui, em 2008, no momento em que o Prosub começou a se delinear, os franceses disseram que estávamos no caminho certo. A reação deles diante do avanço brasileiro foi de respeito. Perceberam que estavam diante de uma equipe e um projeto diferenciados e se dispuseram a colaborar. Nós pensamos que, se não colaborassem, o tempo e o custo seriam outros, mas nós mesmos faríamos, não havia a menor dúvida quanto a isso”.
Na França, nos Estados Unidos e na Inglaterra houve a vantagem tecnológica de o submarino de propulsão nuclear derivar de um amplo programa de investimentos em armamentos. Aqui, ao contrário, foi preciso construir tudo a partir do zero e exclusivamente para a produção desse equipamento.
A planta nuclear é, portanto, um projeto inteiramente da Marinha do Brasil e inclui de condensadores a geradores de vapor, bombas de resfriamento, pressurizadores, estruturas mecânicas do elemento combustível, elementos combustíveis de urânio e até mesmo o vaso do reator nuclear, além dos sensores de fluxo neutrônico e sistemas de controle de potência.
O prédio principal do estaleiro de construção e o pátio de manobras de submarinos estão concluídos
O programa nacional acumula avanços. No ano passado, o Brasil, que antes só vendia o minério bruto, começou a exportar urânio enriquecido para a Argentina, através das Indústrias Nucleares Brasileiras e com tecnologia da Marinha Brasileira.
Isso só é possível, explica Ferreira Marques, porque se fez uma parceria envolvendo inovações entre os ministérios da Ciência e Tecnologia e da Defesa. “Essa exportação muda o patamar do País. Não somos só reservatório de minério, temos competência, inclusive, para vender combustível nuclear no exterior. Isso é interessante porque dá um recado a participantes desse mercado.
Os chineses, por exemplo, têm assediado vários países da América do Sul para lhes fornecer combustível nuclear. Nós dizemos: não precisa trazer da China, o nosso país faz”, sublinha o oficial.

O Programa Nuclear da Marinha tem investimentos programados de 2,2 bilhões de reais entre este ano e 2021, e compreende, além do desenvolvimento de sistemas de propulsão nuclear, um conjunto de laboratórios e meios para a realização de testes nos setores nuclear, mecânico e químico, entre outros.

São cerca de 2 mil engenheiros e técnicos (70% civis), entre eles 266 mestres e 69 doutores que operam em 25 laboratórios, na sede no campus da USP, na capital paulista e no Complexo de Aramar, em Iperó. Os parceiros são as maiores universidades do País e institutos de tecnologia, entre outros. 

As conexões do Programa Nuclear da Marinha com o Prosub envolvem a produção de combustível nuclear e de sistemas de propulsão.

As ligações com o Programa Nuclear Brasileiro incluem as Indústrias Nucleares do Brasil, no que se refere às cascatas (ultracentrífugas em série) para a separação de isótopos, necessária ao enriquecimento de urânio; o Reator Multipropósito Brasileiro, para enriquecimento do urânio a 19,9% – utilizado na produção de radiofármacos – e a Eletronuclear, para testes de equipamentos e caracterização de materiais.

No complexo de Aramar destacam-se, entre outras instalações, a unidade de produção de hexafluoreto de urânio, metade em funcionamento e o restante com previsão de término de montagem em dezembro deste ano, e o Laboratório de Geração Nucleoelétrica (Labgene), onde se constrói o protótipo em terra do sistema de propulsão naval nuclear. “Até 2007, o Prosub era tocado basicamente pela Marinha.

O capitão de mar e guerra Miranda, o engenheiro Calvelo e o forno que França, Alemanha e EUA não quiseram vender e foi fabricado pela Marinha
Quando o presidente Lula, no dia 13 de julho daquele ano, visitou Aramar, viu o que se fazia aqui e concluiu que não estávamos longe dos objetivos. Programou recursos e saímos de uma dotação de 70 milhões de reais por ano para 300 milhões. Assim o Prosub floresceu e arrastou o Programa Nuclear da Marinha, e este só existe por causa daquele”, chama atenção o contra-almirante. 

A diversidade produtiva e de verificações exigida pelo PNM gera o chamado arraste tecnológico, que consiste em benefícios para empresas e a sociedade. Esses “subprodutos”, digamos, incluem a realização de testes de itens de segurança para a Eletronuclear e o fornecimento de sistemas de separação isotópica para as Indústrias Nucleares Brasileiras.

Outro exemplo é a utilização, na usina de Três Gargantas, na China, de peças usinadas no complexo metalúrgico da Marinha em Itaguaí, a pedido de empresas brasileiras que participaram da obra.
Turbinas a vapor para cogeração de biomassa, fabricadas pela Siemens de Jundiaí para a Colômbia, foram testadas em Aramar, com os mesmos equipamentos usados para verificar o funcionamento daquelas próprias para uso nos submarinos (a alternativa da empresa era enviá-la à matriz, na Alemanha).
Há alguns meses, os engenheiros que projetaram instalações em Aramar, que, por exigência da Comissão Nacional de Energia Nuclear, são preparadas para terremotos, ajudaram a refazer o projeto da estação científica do governo federal no Arquipélago de São Pedro e São Paulo, em Pernambuco, situado em área sujeita a abalos sísmicos. 

Reator Multipropósito Brasileiro permitirá aumentar a capacidade de produção de radiofármacos, utilizados pela medicina nuclear para diagnóstico ou terapia, hoje fabricados principalmente pelo Ipen--USP, de 1957.

O aparato da Marinha em Aramar é utilizado também para testar sensores inerciais de plataformas de petróleo, vendidos propositalmente com defeito pelos fabricantes para impedir desvios de finalidade, a exemplo da sua utilização na construção de mísseis, explica Ferreira Marques. Sensores com defeito usados nas plataformas funcionam em condições normais, mas perdem a confiabilidade em situações climáticas extremas.
Técnicos da Petrobras acompanham as verificações e correções desses dispositivos em Aramar e recebem garantia e manual, como costuma acontecer na aquisição de um equipamento novo. “E depois o pessoal acha que a gente não precisa desenvolver tecnologia própria.
Tem de ter, tem de ter. Tecnologia própria e independência é o nosso lema”, sublinha Ferreira Marques. A frase, estampada nas paredes do complexo, foi cunhada pelo almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear e considerado o pai do Programa Nuclear Brasileiro.
A Marinha quis comprar da francesa Jeumont um motor para o protótipo de submarino, a empresa não quis saber, mas cedeu quando a brasileira WEG entrou na conversa
Preso na Operação Lava Jato e condenado a 43 anos de reclusão, o almirante está em liberdade desde a quarta-feira 11, no momento em que esta reportagem foi entregue para a impressão. “Tudo que tem em Aramar foi rascunhado pelo almirante Othon, até 1994. É inegável e é meritório”, diz Ferreira Marques. 

A independência do Programa Nuclear da Marinha é posta à prova com frequência por vetos do governo dos Estados Unidos. Apesar do contrato assinado em 2007 com a Toho Tenax, uma das maiores fabricantes mundiais de fibra de carbono, o Departamento de Comércio estadunidense vetou a exportação, com o argumento de que poderia “ser prejudicial à segurança dos Estados Unidos”.

Em caso mais recente, a Marinha fez licitação para a fabricação de uma liga especial de prata, índio e cádmio, que serve para controlar a fissão nos reatores nucleares. O contrato não chegou a ser assinado, entretanto, porque a vencedora foi comprada por uma empresa dos EUA e o dono impediu a venda.

O PNM enfrenta restrições também em outros países. França e Alemanha, além dos EUA, não quiseram vender um forno para calcinação de trióxido de urânio, destinado à produção de concentrado puro de urânio. Apesar de o Brasil ser signatário dos tratados de uso pacífico de energia atômica, isso não garantiu o acesso ao equipamento produzido no exterior.

A resposta da Marinha a essas situações é produzir os itens com fornecimento bloqueado no exterior. A qualidade não é a mesma no início, mas a experiência acumulada em sucessivas substituições de importações interditadas costuma dar bons resultados. “No fim de agosto, nós fizemos com o Ipen o primeiro combustível metálico, que permite concentrar mais energia em menos volume. Não é qualquer país que faz isso”, chama atenção Ferreira Marques.
Quanto mais o Brasil e suas empresas confiam e investem no desenvolvimento próprio, maior o respeito no exterior e mais amplas as possibilidades de parcerias de igual para igual, em âmbito local e com os grupos estrangeiros também, mostra o exemplo a seguir.
A Marinha tentou comprar da francesa Jeumont Electrics um motor de propulsão para o protótipo de submarino, mas a empresa não quis conversa. Quando soube, entretanto, que havia conversas para encomendar o equipamento à WEG, sua concorrente brasileira respeitada mundialmente, a Jeumont imediatamente se disse interessada no negócio.

Em resposta ao suposto pagamento de propina a militares relacionados ao Prosub, noticiado em 18 de abril, a Marinha reiterou a esta revista desconhecer qualquer irregularidade envolvendo o Programa, bem como o “Almirante Braga”, misteriosa personagem de pura criação ficcional, citado nas reportagens.

O almirante Othon, pai do Programa Nuclear Brasileiro, libertado pela segunda vez de prisões determinadas pela Lava Jato
O programa de construção de submarinos transfere tecnologia, fortalece a indústria e deveria ser um modelo para o País.
Segundo o setor de imprensa, “o Tribunal de Contas da União acompanha todo o desenvolvimento do Prosub desde o seu início, a pedido da Marinha do Brasil, por meio da realização de auditorias, e todas as orientações daquela Corte foram cumpridas. O plenário do TCU já emitiu e aprovou nove acórdãos, desde o início do Programa”.
Ainda sobre esse assunto, diz a nota do setor de imprensa: “Em reportagem veiculada no Jornal Nacional no mesmo dia 18, os executivos da Construtora Norberto Odebrecht Benedicto Júnior e Luiz Eduardo Soares delataram um esquema de suposto desvio na construção do submarino nuclear brasileiro para pagamento de propina, mas negaram a participação de qualquer integrante da Marinha do Brasil.
Destaca-se que a reportagem cita um suposto ‘Almirante Braga’, mas o referido oficial não existe nem na ativa nem na reserva da Marinha do Brasil”.

Percalços e contratempos à parte, o Prosub e o Programa Nuclear da Marinha poderiam muito bem inspirar uma retomada do dinamismo e do vigor vistos em outros momentos no País.

A frase “quem decide o destino do Brasil são os brasileiros”, pronunciada por alguns oficiais do Rio de Janeiro e de São Paulo, parece ser, ao mesmo tempo, o princípio, o guia de ação e o objetivo da ação de amplo escopo aqui documentada.
Fonte: CARTA CAPITAL

O inferno de Temer continua


Governante mais impopular do planeta, segundo uma pesquisa divulgada nesta semana pela consultoria Eurasia, Michel Temer conseguiu mais uma vez se salvar. Graças a sua conhecida habilidade na arte de aliciar deputados, Temer escapou da denúncia por obstrução judicial e comando de organização criminosa, mas obteve uma vitória de Pirro. Sem alcançar a maioria dos votos na Câmara dos Deputados, Temer mostra ao País uma base de apoio frágil – e que tende a se esfacelar ainda mais, com a proximidade das eleições. Estar próximo a ele significa se associar a um projeto ilegítimo, impopular e fracassado diante da grande maioria dos eleitores.

Se isso não bastasse, a luta de Temer pelo poder não se esgotou. Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal apressou o inquérito que investiga sua participação em esquemas de corrupção no porto de Santos – o que significa que ele ainda pode vir a ser alvo de uma terceira denúncia. Além disso, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que se mostra cada vez mais insatisfeito, ainda tem 25 pedidos de impeachment engavetados contra Temer. Fechando a semana, um dia depois do livramento de Temer, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) soltou uma nota duríssima em que sugere que os brasileiros saiam às ruas para lutar contra a compra escancarada de deputados e retrocessos como a liberação do trabalho escravo nas fazendas – uma das moedas usadas na barganha da semana passada.

O enfraquecimento de Temer, agora convertido em "pato manco", não significa, no entanto, que sua capacidade de produzir danos esteja esgotada. Uma de suas próximas tarefas é privatizar a Eletrobrás, no momento em que o Brasil convive com reservatórios secos, acaba de aumentar em 43% a bandeira vermelha da energia elétrica e já enfrenta riscos de apagão. Se a situação já era precária, a segurança energética do País tende a se agravar ainda mais com a possível transferência do parque gerador nacional a grupos privados – ou a estatais chinesas.

Temer tentará ser lembrado como um "presidente reformista", mas, a este momento, já deve ter se arrependido de ter participado de uma conspiração política que fez com que o Brasil chegasse ao atual nível de degradação moral e institucional. Três de seus melhores amigos, Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima e Henrique Eduardo Alves, estão presos e ainda o assombram. Prova disso foi a batida no Ministério do Turismo na semana passada contra três assessores de Henrique Alves, que, segundo a Polícia Federal, comandaria esquemas de corrupção de dentro da cadeia.


Metido a poeta, Temer já escreveu que embarcou em muitas naus sem chegar a lugar nenhum. O que as pesquisas mostram é que a chamada "ponte para o futuro" foi mais uma uma dessas canoas furadas, que já se transforma em ponte para o inferno aos olhos da população brasileira.